A Inteligência Artificial, agora um tópico popular, tem suas raízes no século XX, especificamente entre as décadas de 1950 e 1960, quando esforços foram feitos para modelar e desenvolver técnicas matemáticas e computacionais com habilidades cognitivas semelhantes às nossas, capazes de aprender com dados e aplicar esse conhecimento para resolver problemas simples. Assim como as sinapses ocorrem naturalmente em nossos cérebros para permitir o raciocínio, o desejo de modelar o raciocínio, a memória e a inteligência humana — e criar um cérebro artificial capaz de sinapses — sempre foi uma meta para cientistas, pesquisadores, matemáticos e neurofisiologistas. Afinal, ter uma máquina inteligente como aliada poderia, em teoria, resolver inúmeros desafios que as habilidades humanas sozinhas não conseguiriam.
No início dos anos 2000, a Inteligência Artificial ainda era um conceito distante, discutido principalmente em círculos de pesquisa acadêmica ou visto como um tópico para ficção científica, em grande parte devido às limitações de poder de processamento e aos custos proibitivos de computadores de alto desempenho capazes de executar algoritmos de aprendizado de máquina com conjuntos de dados massivos e modelos complexos. Nos 20 anos seguintes, avanços significativos em acessibilidade e custos de processamento reduzidos — especialmente com a popularização da computação em nuvem — tornaram viável aplicar algoritmos de aprendizado de máquina mais complexos, como o Deep Learning, que por sua vez democratizou cada vez mais os benefícios da Inteligência Artificial.
Hoje, a IA é tão prevalente na cultura popular que evoluiu da SkyNet do filme de Hollywood Terminator para ser vista como uma assassina de empregos, como exemplificado pelo uso generalizado do ChatGPT da OpenAI, que causa arrepios na espinha de algumas profissões. No entanto, a implementação bem-sucedida da IA enfrenta desafios que vão desde o treinamento adequado e sem preconceitos até a superação das barreiras culturais de organizações que preferem não evoluir processos que percebem como funcionando bem, mesmo que esses processos não tenham eficiência ou produtividade.
No âmbito da gestão de ativos, uma história de sucesso notável é a aplicação de IA e Visão Computacional para mapeamento de ativos de energia elétrica, um projeto que está sendo implementado em várias empresas de distribuição de energia no Brasil. A solução envolve equipamentos que compreendem câmeras de alta definição, GPS e outros hardwares montados no topo dos veículos. Esses veículos circulam pelas ruas da cidade, capturando imagens de toda a rede de distribuição de energia, incluindo postes, transformadores, cabos e lâmpadas. O software alimentado por IA processa automaticamente essas imagens e identifica todos os ativos na rede elétrica, até a potência de cada poste de luz em uma cidade inteira. O resultado final desse mapeamento é um inventário que é concluído até 100 vezes mais rápido e com mais precisão do que os métodos tradicionais para os ativos de uma empresa de distribuição de energia.
No entanto, nem todo problema requer uma solução de IA; modelos estatísticos tradicionais podem — e devem — ser aplicados com bons resultados. Há um burburinho de que as empresas precisam aplicar a Inteligência Artificial como se fosse um requisito para evitar serem rotuladas como obsoletas, como se a IA fosse o Santo Graal que salvará ou ameaçará a humanidade. Em casos mais simples, ter processos eficientes e indicadores de desempenho claros já é uma melhoria significativa. Para que a IA realmente agregue valor, alguns requisitos básicos precisam ser mapeados, como objetivos claramente definidos, a(s) tecnologia(s) a serem usadas, o impacto no processo atual e o retorno do investimento. Muitas vezes, as decisões de investir em um projeto de IA são motivadas pela inovação, mas com retornos econômicos questionáveis.
Também é importante mencionar o comprometimento da alta liderança nas organizações que buscam aproveitar o potencial de geração de valor da IA, explicando claramente o impacto nos processos e como a nova configuração afetará tanto os processos quanto as pessoas envolvidas, para não gerar insegurança sobre a substituição pela IA.
Parafraseando a Física e seu conceito de inércia, que afirma que qualquer objeto em repouso ou se movendo em linha reta permanecerá em repouso ou continuará seu movimento até que seja acionado por uma força externa, é mais fácil para uma empresa não fazer nada ou manter um modus operandi que está em vigor há anos do que buscar a evolução (ou revolução) por meio da implementação de IA. Para que a Inteligência Artificial gere valor, é desejável uma decisão estratégica, bem como um movimento de toda a empresa com um plano de gestão de mudanças bem elaborado. Afinal, neste caso, inovação significa tornar os processos mais eficientes e gerar valor para o mercado.
André Sih, sócio-gerente da Fu2re Smart Solutions, e Jardel Pinto, gerente de estratégia de manutenção e confiabilidade de equipamentos na MODEC e vice-presidente de garantia de valor na Shape Digital.
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